"A dor é inevitável, o sofrimento é opcional"


(Autor desconhecido)

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Parte 09 - Amapá, uma abstração? – Por Kelly Tork

Enquanto vagava me deliciando com as palavras destes ilustres desconhecidos (por favor, desconhecidos apenas para a minha pessoa), me ative à menção que alguém fez a um texto de outra jornalista chamada Kelly Tork, em resposta a crônica publicada no jornal de Goiás, ao qual nosso amigo infalível Google teve a fineza de me guiar.

Foi um texto que com certeza me emocionou. Aliás, tive um dia de fortes emoções presenciando e descobrindo o quanto este povo pode se empenhar em defender esta terra tão querida.


Amapá, uma abstração? – Por Kelly Tork

Já dizia o pensador chinês Confúcio: “A ignorância é a noite da mente: mas uma noite sem lua e sem estrelas”. Ninguém é obrigado a saber tudo. Tudo bem. No entanto, a maior virtude do ser humano é, ao se deparar com a falta do saber, buscar a luz do conhecimento.

Em tempos de internet 2.0, o que não dá é pra incorporar a síndrome de Gabriela: “eu nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim…”. Ainda que não se queira utilizar as tradicionais (e alguns até diriam, chatas) fontes de pesquisa, como sites de notícia e enciclopédias, outras possibilidades existem, como o divertido e colorido “Orkut”, os amigos virtuais do “MSN”, ou o até a febre do momento, o “Twitter”. Na falta disso, vale apelar para os antiquados meios de comunicação como TV, rádio ou jornal.

Mas o que não dá pra aceitar mesmo é que uma pessoa que repassa suas impressões, (de)formadora de opinião, transmita a escuridão de seus pensamentos para aqueles que o rodeiam. Eu, jornalista que sou, estudiosa dos fenômenos da mídia (e por isso busco observá-los da maneira mais imparcial possível), senti vergonha ao ler um texto sobre o Amapá escrito por Rogério Borges e veiculado no Magazine Popular, de Goiânia.
Não, não. Não se antecipe em pensar que fiquei horrorizada com algum fato narrado que por aqui se passou. Antes fosse, mas nada disso. Minha decepção foi ao ver o nobre colega dizer que não acredita que o Amapá exista simplesmente porque ele não o conhece ou porque a Globo nunca fez uma minissérie sobre o Estado.

Rogério e leitor, se me permitem, vamos pegar uma pequena lanterna e clarear alguns fatos. A despeito do que afirma o ilustre colunista, o Amapá já foi sim notícia em várias grandes emissoras de TV, como SBT, Record e até (pasmem!!) a Rede Globo. Sim, correspondentes nacionais da “toda poderosa” já estiveram no Estado algumas vezes para Globo Repórter, Globo Esporte e Globo sei lá mais o que. E não é de hoje que os fenômenos naturais como o Equinócio e a Pororoca chamam a atenção do Brasil e do Mundo para a região.

Bem, se você pesquisou um pouco mais, pode até argumentar esses espetáculos não são privilégio exclusivo do local. De fato, não são. Mas a Fortaleza de São José, maior fortificação portuguesa construída no Brasil, é. E digo mais, sabiam que ela (ao lado do Cristo Redentor, do Maracanã e outras mais) foi eleita uma das 7 maravilhas do Brasil?

Em 2008, a Escola de Samba do Rio de Janeiro Beija-Flor foi campeã com um enredo que relatava o que mesmo? Ah! Aquela cidade às margens do maior rio do mundo localizada sobre uma linha imaginária que, segundo Borges, não existe. O que? Vai dizer que, porque nunca viu, o Rio Amazonas também não existe? Nesse caso, serei obrigada a lhe apresentar um senhor que sabe de muitas coisas chamado “Google”, dele você ouviu falar, não?

Tá certo que nossa exportação não é assim tão expressiva, mas exportamos sim. Exportamos minérios, soja, pescado e até talentos. Já assisti, mais de uma vez, Fernanda Takai, vocalista da Banda Pato Fu, declarar que nasceu em Serra do Navio. Fora alguns outros talentos que vez por outra aparecem nos grandes programas de entretenimento – Convenhamos que qualquer outra coisa fora do eixo Rio-São Paulo- Bahia recebe menor atenção da mídia. O que não quer dizer que eles não existam. Aqui temos grandes músicos, poetas, escritores, pintores, artistas de uma forma geral.
Voltado ao amigo de Goiás, sinceramente, fiquei em dúvida se o que presenciei foi pura ignorância ou apenas uma tentativa infeliz de autopromoção. De qualquer modo, se ainda duvida da existência do Amapá, é só sair da comodidade do seu mundinho e vir tomar açaí, comer maniçoba, dançar marabaixo e sentir a hospitalidade de um povo que recebe a todos de braços abertos. Vou dar a dica: nem precisa pedir pózinho da fada Sininho, as companhias aéreas já operam pra cá.

Ah, já ia esquecendo… quanto ao Sarney, eu me rendo, devo admitir que esse sim é uma lenda. Um mistério que ninguém consegue compreender.

*Jornalista, especialista em Comunicação e Política, professora do curso de comunicação.




Termino esta postagem com um dos comentários deixados nesta postagem de Kelly Tork:




“O nome do Estado de Goiás, segundo li, origina-se da denominação da tribo indígena ‘guaiás’. Vem do termo tupi gwa ya que quer dizer indivíduo igual, gente semelhante, da mesma raça. Que ironia!
Assim como eu, nós do Amapá conhecemos goianos que são pessoas maravilhosas, alegres, educadas e inteligentes. Que sorte!
O que me surpreendeu é que o slogan do jornal para o qual este “jornalista” escreve é: “notícias com qualidade e ética em Goiás”. Que piada!”




Não é, com certeza, um sentimento nobre. Mas é incrível como a gente consegue se divertir testemunhando a revolta de outrem.

Um comentário:

  1. Às vésperas do natal de 2001, o jornal mineiro Hoje em Dia publicou uma crônica intitulada "Toalha de restaurante alemão", do colunista Eduardo Almeida Reis (http://migre.me/zPrP), que causou a mesma polêmica do texto "Amapá, uma abstração", de Rogério Borges, publicado na seção “Crônicas e Outras Histórias”, edição de 07/04/2010, do até então desconhecido jornal O Popular, de Goiânia (www.opopular.com.br/).

    Sem entrar na polêmica sobre a forma do texto, se crônica ou não, vejo na abstração do Reis sobre o Amapá o humor nada sutil da Toalha mineira. Nada a ver com as provocações imbecis do Mainard, um fascitóide idiota, e com o ensaio "Abraxas: uma abstração e outros absurdos literários", de Damnus Vobiscum, cuja relação fica somente no título.

    Por isso causou-me estranheza ninguém fazer referência ao texto de 2001, que motivou o Ministério Público amapaense a promover ação contra o jornalista mineiro, em que pedia uma indenização de R$ 50 milhões por danos morais ao povo do Amapá (não sei que bicho deu a ação do MP).

    Em seu blog (http://rogeriopborges.blogspot.com), o autointitulado "jornalista por vocação" se defende das acusações que lhe são feitas por amapaenses e se queixa dos ataques pessoais que vêm sofrendo. Tem razão. Muitos comentários postados em blogs que divulgaram seu texto são reveladores de um chauvinismo cego, além de uma uma grosseria típica de ignorantes.

    Mas é difícil aceitar seus argumentos literários em defesa de um texto que, mesmo admitindo-se como crônica, expôs a falta de humor e a crítica mordaz presentes, por exemplo, nas crônicas de um Luis Verissimo, quando aborda temas delicados, que envolvem questões étnico-raciais, culturais e costumes sociais e políticos.

    Ao longo da história da humahidade, escritores e artistas utilizaram o riso como arma de combate à opressão e injustiças. É a sátira que permite a abordagem de questões que não poderiam ser de outra forma, por se situar no limite entre a tensão política e a banalidade social - duas forças que se contrapõem - fazendo transbordar o riso em diferentes formas.

    Para isso, no entanto, é preciso que o escritor/artista conheça profundamente a realidade criticada e tenha domínio da forma do gênero que utiliza, seja uma crõnica, um conto ou a poesia. A de Gregório de Matos, exemplo de sátira barroca, ao apontar erros e defeitos vigentes à época através do humor, manifesta uma profunda relação com a terra em que habita. A sátira de Gregório busca a afirmação de uma brasilidade em oposição a dominação (identidade) portuguesa.

    Se eu esculhambasse com o Amapá - do tipo; sabe por que o Amapá não afunda? Não, é porque merda não afunda - outros amapaenses ririam disso. A razão é simples, estamos situados em um mesmo contexto, o outro amapaense entenderia as razões da minha chacota, mesmo pegando pesado. A linguagem de baixo calão e o chiste estão entre as manifestações que surgem através da sátira. Quem viu a comédia de costumes Ver do Ver-O-Peso, do grupo paraense Experiência, sabe do que estou falando.

    O nosso Borges não entendeu nada disso. Mexeu com forças que se opõem, para ele desconhecidas. Mesmo dando todos os descontos possíveis à forma e ao conteúdo de seu texto, para os amapaenses não passa de um "estrangeiro" que fala mal da terrinha, sem com ela ter alguma forma de relação que justifique, incluindo o plano emocional, a esculhambação; mexeu com forças telúricas e identidades conflitantes de um povo que se sente historicamente marginalizado e objeto de preconceitos por brasileiros de outros estados. Vistos somente através de fatos negativos.

    Tal o Géografo de Itambé do Mato Dentro (pseudônimo utilizado pelo colunista mineiro), Rogério Borges pode botar a culpa por tudo no Sarney e nos surrealistas Marimbondos de Fogo que o elegeram senador pelo Amapá.

    Mas não escapará do destino dos aprendizes de feiticeiro: de tornar-se um imortal da Academia dos Contadores de Piada sem Graça.

    Por Herbert Marcus, jornalista.

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